sábado, 19 de julho de 2008

EM GUARDA CONTRA O PERIGO VERMELHO OU O GOLPE QUE CHAMARAM DE REVOLUÇÃO.

“A história assim concebida não é uma sucessão de fatos mudos, mas uma seqüência de passados oprimidos, que têm consigo um ''ndice misterioso'', que os impele para a redenção”.

ROUANET,SérgioPaulo-In, MORAES, Denis de-“A esquerda e o golpe de 64”-Rio de Janeiro: Espaço e Tempo, 1989.

Partindo das “Matrizes do Anticomunismo” legitimadas pela Igreja (catolicismo), o Nacionalismo (bandeira dos conservadores) e pelo Liberalismo, o texto de Rodrigo Patto ("EM GUARDA CONTRA O PERIGO VERMELHO") subsidia o entendimento da citação do texto de Rouanet. O que interessava aos “defensores" da família, da hierarquia, era formar uma imagem dos comunistas que os colocassem no imaginário do povo, como demônios, inimigos implacáveis da ordem e do bem social.
Fato curioso no movimento anticomunista, era que, o grupo que defendia tal movimento não se baseava em uma homogeneidade, pelo contrário, era formado, também, por membros vindos de setores que nem em todos os momentos, concordavam com o trato dado aos comunistas. Muitos dos membros do movimento possuíam opiniões próprias e as defendiam, não simplesmente concordavam com o grupo.
O movimento anticomunista, pelo acima exposto, tinha dois olhares com relação aos comunistas: O olhar fascista, de direita, e o outro do socialismo democrático, daqueles que se posicionavam mais à esquerda.
Dentro do olhar fascista, “não há lugar para conflitos. Qualquer tipo de conflito é um problema, uma degeneração que deve ser imediatamente extirpada (com a morte)”.
Segundo Rodrigo Patto, alguns momentos foram fundamentais para a investida anticomunista:
Em 1935 acontece a Intentona comunista;
Em 1937, a ditadura Varguista com a implantação do Estado Novo;
De 1946 a 1950, o PCB (Partido Comunista Brasileiro) sofre uma dura perseguição no Brasil;
E, em 1964 o Golpe Militar.
De todos esses momentos, Rodrigo Patto dá à Intentona Comunista um valor especial no combate ao comunismo.
O anticomunismo, apesar de não ter sido o fator principal, foi um “combustível” muito importante na queda de Jango (João Goulart), que, ao contrário do que se imaginava, não era comunista, ou, em nenhum momento se afirmou como tal. Era sim, preocupado com questões nacionalista e populares. Não havia em Jango a intenção de promover no Brasil uma revolução socialista. Vale lembra que no Brasil, ao contrário do ocorrido na Europa, a idéia de anticomunismo estava ligada aos setores de direita da sociedade.
Fato curioso é que as manobras do Catolicismo, do Nacionalismo e, do Liberalismo, construíram a base dos ataques anticomunistas, e isso nem sempre acontecia com uma unanimidade de idéias. As divergências aconteciam e ainda assim a perseguição se fazia de forma implacável. Os comunistas eram, segundo o “tríplice julgamento”, seres abomináveis que se equiparavam mais às feições do Diabo do que à bondosa imagem de Deus.
Vasta foi a imaginação do anticomunismo na empresa contra seus inimigos, chegando a extremos para incutir no imaginário popular os “perigos que os rodeavam":
Eram Demônios, as mãos invisíveis do diabo, cria do tinhoso, classificavam Moscou como o “império das trevas”, a “cidade de satã”.
O comunismo era uma “seita internacional” que tinha como líder Karl Marx.
Os ataques objetivavam formar no imaginário popular, imagens que ligavam os comunistas a animais terríveis como o Polvo (o polvo vermelho), as hienas (hienas vermelhas), a serpente, a hidra moscovita, o lobo, o abutre, enfim, toda a fauna temerosa estava presente na classificação dos comunistas como a degradação social.
Ainda, como se não bastante fosse a equiparação acima citada, os comunista eram também as mais temíveis doenças a darem passos largos e ameaçadores em direção do povo; eram a representação em duas pernas da peste, dos vírus, dos bacilos, dos germes, dos quistos, e de todo um dicionário médico classificador de doenças.
Eram ainda uma grande ameaça externa, uma conspiração internacional maquinada em terras habitadas por seres estranhos, alienígenas assim por dizer.
Representavam também uma terrível ameaça à moral. Os comunistas, segundo o movimento do anticomunismo, eram a própria depravação, pregavam o amor sem limites, a propagação da liberação sexual em sua plenitude. Promoviam, através de jornais, revistas, televisão e outros meios de comunicação o apelo sexual, idêntico ao que hoje invade nossas casas sem o nosso consentimento, e, engraçado, o “perigo vermelho” hoje não ronda as salas da sociedade e nem os altares das igrejas. Muito engraçado!!!!
A iconografia também foi largamente utilizada para o fortalecimento do combate ao “perigo vermelho”; O comunismo diabólico em uma charge, misturava em um grande caldeirão junto com ele próprio a anarquia e a liberal democracia; Em outra charge, a campanha de alfabetização promovida pelos comunistas doutrinava o povo a acreditar em propostas subversivas como, vejam só, reformas de base!; A imagem do comunista em outro desenho, em posição ameaçadora, aponta sua arma para o povo que foge apavorado para a direção contrária onde se localizava uma igreja, e em grandes letras a inscrição “O COMUNISMO DESTRÓI A TUA FÉ”, e, o castigo aplicado a um comunista profanador da imagem de Maria também representado em charge de grande circulação da época.
Enfim, várias foram as campanhas empreendidas em prol do combate à ameaça do comunismo utilizando a iconografia, “O comunismo despreza a tua religião, a criação do catecismo anticomunista pelo arcebispo de diamantina D. Geraldo de Proença Sigaud, o comunista como representação do ódio, da traição e do derramamento de sangue, o comunismo como destruidor da bandeira da liberdade, idéia esta propagada pelo “Órgão de Repressão à Delinqüência e Combate ao Comunismo LEI E POLÍCIA”, o comunismo como escravizador do mundo, a comparação (já citada anteriormente) do comunista com um inseto que precisa ser exterminado, o grande amigo urso.
Além das formas de combate ao comunismo já citadas, muitas outras foram aplicadas como as Organizações Anticomunistas. Entres várias dessas organizações, podemos citar algumas como: Defesa Social Brasileira e Frente Universitária de Combate ao Comunismo, a Liga de Defesa Nacional (LDN), foi criada em 1952 a CBA, Cruzada Brasileira Anticomunista, que teve como tempos áureos a década de 1950, a Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP). A TFP não era engajada unicamente no anticomunismo, mas fazia parte de seu programa, tanto que nos anos de 1960 e 1970 empreendeu forte luta na campanha anticomunista.

Como análise final do texto de Rodrigo Patto, julgo ser de suma importância estar com todas as atenções voltadas para o embate travado por longo tempo entre o comunismo no Brasil e seus opositores, a importância que tal embate representou em momentos fundamentais para o direcionamento político do Brasil e para a semeadura das sementes que germinariam em forma de novas posições sociais, políticas e ideológicas de outras épocas.
Não podemos, também, deixar passar despercebidas as diversas investidas de forma manipuladora dos anticomunistas contra o imaginário popular com o objetivo de transformar cada pessoa em um sentinela atento contra um perigo criado a partir dos interesses de grupos sociais temerosos da perda de sua soberania e de seu controle exercido de acordo com suas conveniências.
Arrisco-me a acrescentar que, o temor existente nos anticomunistas, incentivou-os a, além de montar barricadas contra “seu” inimigo vermelho, também a transforma-lo em ameaça ao povo.
Permitir que as idéias comunistas se infiltrassem nas camadas populares, seria permitir que os bastidores da derrocada do moral católico, do nacionalismo dos conservadores e do liberalismo se estabelecesse com a passagem do poder para outras mãos.
Como linhas finais, peço licença a Rodrigo Patto para mais uma vez citar um trecho do livro de Denis de Moraes. Desta vez trata-se de um fragmento do manifesto do CPC (Centro Popular de Cultura) da UNE (União Nacional dos Estudantes) de 1962:

“ Para nós, tudo começa pela essência do povo e entendemos que esta essência só pode ser vivenciada pelo artista quando ele se defronta a fundo com o fato nu da posse do poder pela classe dirigente e a conseqüente privação do poder em que se encontra o povo. Se não se parte daí, não se é nem revolucionário, nem popular, porque revolucionar a sociedade é passar o poder ao povo”.

É por isso, primordialmente por isso, que 1964 viveu um GOLPE e não uma REVOLUÇÃO.

Valdelir Ferreira Couto

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